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Arquitetos: PF Architecture Studio
- Ano: 2020
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Fotografias:João Morgado
Descrição enviada pela equipe de projeto. A obra é relativa à intervenção num edifício inserido num complexo industrial, localizado numa área limítrofe norte da cidade do Porto, contíguo à Estrada da Circunvalação. O complexo industrial, com cerca de 42 000,0m², é composto por um conjunto de edifícios, com funções distintas (produção, I&D, administração) e cujas construções denuncia clara estratificação, sobretudo em termos de sistemas construtivos e utilização de materiais, fruto de intervenções ao longo de mais de um século.
É possível observar edifícios em paredes autoportantes de granito e caixilharias em ferro e edifícios com estrutura de betão armado e caixilharias em alumínio. O objectivo dos proprietários passava pela intervenção no edifício administrativo para introdução de um programa destinado aos colaboradores, nomeadamente os gabinetes médico e enfermagem, a sala de recursos humanos e o refeitório. Em relação ao refeitório era pretendido que a sua "atmosfera" se aproximasse mais de um restaurante, com capacidade para servir diariamente entre 350 a 400 refeições, do que de uma cantina industrial e também era pretendido que a intervenção cumprisse os requisitos regulamentares para acessibilidade de pessoas com mobilidade condicionada.
A empresa Monteiro, Ribas Industrias - S.A. nasceu no início do séc. XIX tendo, durante grande parte da sua existência, dedicado a sua actividade aos curtumes, mas nas duas últimas décadas, reconverteu o seu modelo de negócio para a produção de embalagens flexíveis. Esta transformação, para além dos propósitos comércios teve sérias preocupações ambientais, preocupações essas que estão na origem do projeto aqui apresentado. Um dos reflexos dessas preocupações ambientais manifesta-se na vontade expressa dos proprietários intervirem num edifício existente em detrimento de construir um edifício de raíz. Assim sendo, a intervenção foi executada numa área do edifício administrativo que funcionava há anos como espaço de armazenagem e arquivo. Os proprietários manifestaram sempre a sua preocupação em intervir em áreas devolutas e/ou expectantes, em vez de construir novos edifícios.
O edifico foi construído no início da década de 70 do século XX, com o propósito de albergar toda a parte administrativa, bem como um sector de produção industrial, armazenagem e arquivos. Construtivamente foi executado num sistema elementar porticado de pilares e vigas em betão armado com lajes aligeiradas. O sistema construtivo é bastante irregular, sobretudo ao nível do desalinhamento dos pilares e das vigas.
A intervenção caracteriza-se, num primeiro momento, por um total respeito pelo caracter da preexistência. Embora esta não apresente valor arquitectónico e histórico, o contexto industrial e o pragmatismo construtivo e formal de todo o complexo industrial definiram as linhas orientadoras do projeto. Dessa forma, surge um espaço funcional, cru, isento de acessórios, mas que consideramos permitir aos colaboradores usufruir de um espaço diferente da linguagem fabril. O espaço privilegia a iluminação e ventilação naturais. Esses requisitos de salubridade foram obtidos através da abertura de grandes vãos envidraçados nas fachadas longitudinais (norte e sul) e na introdução de caixilharias oscilo-batentes nas fachadas transversais (nascente e poente).
Em termos de organização funcional, os gabinetes médico e de enfermagem, bem como a sala de recursos humanos localizam-se próximo à entrada principal do edifício, e o refeitório fica mais afastado, funcionando de modo mais independente. Esses dois núcleos distintos são divididos por um núcleo de serviços que contém as instalações sanitárias, bem como a cozinha e todos os seus espaços dependentes. Os acessos às áreas da cozinha são estabelecidos pela fachada norte, onde tem um arruamento por onde já é estabelecido o acesso a viaturas para cargas e descargas, bem como dos serviços municipais para recolha dos resíduos sólidos. Por sua vez, o refeitório "denuncia-se" de modo mais generoso para a fachada sul, pois trata-se de um espaço sem acesso viário e com maior exposição solar.
Como no briefing era clara a vontade dos proprietários em que o refeitório abandonasse a ideia tradicional de cantina e aproximar-se o mais possível da atmosfera de um restaurante, através da criação de vários ambientes e com diferentes possibilidades de distribuição de mobiliário, a solução encontrada para atingir este objetivo passou pela desconstrução da ideia de nave, através da introdução de dois pátios exteriores cobertos que recortam o espaço, permitindo o uso do espaço exterior e criando simultaneamente áreas de caracter e escalas distintas no interior. Esta desconstrução da nave é reforçada pela inclusão de uma sucessão de planos/biombos, ora fixos, ora pivotantes, compostos por ripados de madeira de Hard Maple, que possibilitam pelo seu movimento múltiplas configurações e articulações espaciais.
A restante intervenção, nomeadamente o corpo da cozinhas e respetivas valências, define-se através de um monólito de bloco de betão aparente que encerra todos os espaços técnicos e de confecção. A utilização do bloco de betão baseou-se no facto de já ser aplicado em paredes divisórias de outros edifício do complexo industrial e a utilização da madeira de Hard Maple teve como objectivo atribuir "temperatura" aos ambientes mais crus. O pavimento é em autonivelante e os tectos são acústicos para melhorar o desempenho acústico do refeitório.
Orientados pelo estudo feito sobre o fluxo em tempo e quantidade, dos grupos de trabalhadores que frequentavam a antiga cantina do Complexo da Monteiro Ribas, procurou-se respeitar os hábitos de distribuição dos mesmos, com várias tipologias de mobiliário, zonas de refeição e lazer. Mantendo os ritmos sugeridos pelo espaço arquitectónico, os vários núcleos de mobiliário mantêm uma relação com os biombos, através do material usado, procurando aquecer a paleta de cores e aproximando a Cantina de um ambiente familiar.
A acessibilidade para pessoas com mobilidade condicionada foi garantida através da introdução de um passeio rampeado na fachada poente, bem como através da demolição integral do pavimento do piso térreo e execução de novo pavimento contínuo sem quaisquer desníveis interiores. Dessa forma, desde o acesso principal na fachada poente, até ao elevador de acesso aos dois pisos superiores, não há quaisquer obstáculos de acesso. Por sua vez, no núcleo dos gabinetes existe uma instalação sanitária adaptada.
Relativamente às questões de eficiência energética, o aquecimento das águas sanitárias e a climatização dos ambientes interiores é estabelecida através de um sistema de cogeração. Este sistema consiste no aproveitamento da energia eléctrica das unidades de produção do complexo industrial para aquecer a água a 90º. A água, fornecida pela rede pública, é aquecida "gratuitamente" pela energia produzida no complexo, e é acumulada no termoacumulador para, por sua vez, ser utilizada nas instalações sanitárias e na cozinha. Em relação à climatização, a água quente da UTAN que permite o aquecimento dos espaços, também é fornecida pelo sistema de cogeração. Desta forma, os custos para aquecimento dos ambientes interiores e das AQS, são residuais.